Antes
de vos escrever sobre o Modelo Minnesota propriamente dito, é importante
algumas ideias sobre o que se passava antes
do aparecimento deste modelo.
O
álcool, ao longo dos tempos, sempre fez parte da vida social, religiosa e
política. Desde os tempos da Babilónia, onde o acto de beber era um “presente
dos Deuses” e utilizado nos rituais religiosos, passando pelos Egípcios com os
“segredos divinos” trazidos pelo Deus Isis, não esquecendo os Hebreus, Gregos e
Romanos com a sua popular bebida, o Vinho. A própria Bíblia faz referência ao
álcool e este sempre acompanhou as actividades humanas de grande escala, como a
Guerra. Também de referir a descoberta de como destilar o álcool, assim como o
desenvolvimento das colónias americanas.
Por
volta de 1784, o Dr. Benjamin Rush torna-se o primeiro Americano a pronunciar
problemas alcoólicos como doença, fazendo referência a uma doença progressiva,
identificando diferentes fases. Inicialmente, Rush não condenava o consumo de
cerveja ou vinho. Referia que, consumidos em quantidades moderadas, promoviam
saúde, mas rapidamente identificou que o caminho certo seria sempre o da
abstinência total. Anos mais tarde, começam a surgir relatos de grupos de
alcoólicos que afirmavam “sentirem-se bem” quando falavam com outros alcoólicos
e sobre o impacto que o álcool tinha nas suas vidas. Começam, de igual modo, a
nascer os grupos fundados por alcoólicos que ajudavam outros alcoólicos, como o
“Washingtonian Temperance Society” (1840) e o “Women´s Christian Temperance
Union”(1874).
Até
1930 os americanos ignoravam os problemas do alcoolismo, estando mais focados
na Grande Depressão e na 2ª Guerra Mundial. Estes eram fechados em hospitais
juntamente com doentes mentais, eram presos ou eram ignorados, sendo o problema
do alcoolismo negado e considerado como uma fraqueza ou doença moral.
Em
1935, surgem dois nomes bastante importantes para o desenvolvimento do
tratamento do alcoolismo, assim como para o Modelo Minnesota: Bill Wilson e Bob
Smith, fundadores dos Alcoólicos Anónimos (AA).
Anos
mais tarde, entre 1940 e 1950, começam, no Estado de Minnesota, nos E.U.A., algumas
experiências para tratamento do alcoolismo. Estas surgiram em 3 centros:
Pionner House, Hazelden e Willmar State Hospital. Este acontecimento foi como
que uma revolta contra a cultura e ideias da época de como os alcoólicos
deveriam ser tratados, como referido anteriormente, e a sua filosofia assentava
toda nos princípios dos AA.
Estes,
de uma forma geral, são os seguintes: 1) Ser Honesto – todas as pessoas
beneficiam com este princípio, apesar de haver uma tendência universal em se
negar o que é desagradável, em evitar falar nos factos negativos, exagerando-se
nas forças e minimizando as limitações; 2) Juntar-se aos Outros – quando
se quer fazer mudanças longas no comportamento, deve-se juntar a outras pessoas
que tenham esse mesmo objectivo. Admitir as dificuldades e admitir ser
necessário a ajuda mútua, poderá transformar limitações em forças; 3) Virar-se
para um Poder Superior – acreditar em algo superior que possa ajudar; 4) “Limpar
a Casa” – Contar a verdade aos outros. O que fizeram devido ao alcoolismo e
depois reparar os danos provocados aos outros. 5) Ficar em forma - As
pessoas em recuperação (deixar de beber e adquirir um estilo de vida saudável)
necessitam de ficar em forma física, social, emocional e espiritualmente.
Importante, também, fazer meditações, rezar e exercícios que renovem os antigos
hábitos de pensar; 6) Ajudar o Outro – Para as pessoas em recuperação o
receber é inseparável do dar. Inicialmente, é necessário receber; mais tarde, é
importante dar. Apenas dando aos outros se consegue manter o que se tem.
Torna-se,
pois, importante caracterizar cada um destes 3 centros.
O
Pionner House foi o 1º centro de tratamento no Minnesota. Patrick Cronin, a 1ª
pessoa reconhecida a ganhar sobriedade através dos AA, deparou-se com o facto
de não haver reuniões na sua cidade. Assim, tentou criar um pequeno grupo de
auto-ajuda num apartamento em Minneapolis. Contudo, e devido às ideias e
cultura que, ainda, estavam definidas na época, a população de Minneapolis, não
aceitou muito bem este facto, o que não permitiu a criação deste grupo. Porém, e convicto de que era necessário
continuar com o programa de AA, de modo a ser ajudado e de ajudar os outros,
Cronin conseguiu um espaço, em 1948, para receber reuniões de AA, assim como
pessoas que necessitavam de ajuda. Este foi chamado de “Pionner House”, onde
cada residente recebia uma cópia do “Big Book” – o texto básico dos AA – e
outros materiais de literatura dos AA, como os “12 Passos” e as “12 Tradições”.
Os
“12 Passos” foram a base do tratamento em Pionner House, onde Cronin,
responsável pelo centro, se focava mais nos Passos 4 e 5, que referem “os
inventários pessoais” e a sua partilha a uma outra pessoa.
Pionner
House, hoje um centro que oferece ajuda a adolescentes com problemas de dependência
química (DQ), será sempre lembrado como o primeiro centro baseado na filosofia
de AA, no Minnesota, que ajudava os alcoólicos das ruas de Minneapolis.
O
centro Hazelden é, por sua vez, associado a Richard Coyle Lilly, igualmente
alcoólico. Em 1947 comprou terrenos perto de Center City, em Minnesota que,
posteriormente, vendeu a um grupo de empresários que queriam construir um
centro de tratamento para alcoólicos. Inicialmente, foi um centro apenas para
empresários alcoólicos que, também, seguia a filosofia de AA, em 1948.
Hazelden
tinha 4 expectativas para os seus pacientes: os pacientes deveriam praticar
comportamentos de responsabilidade, assistir a palestras sobre os 12 Passos,
envolverem-se com outros pacientes e fazer as suas camas. Outra inovação foi a
integração de um conselheiro (alcoólico em recuperação e pessoa habilitada no
tratamento de dependências) como residente do centro.
Por
outro lado, Hazelden criou o “Fellowship Club”, um “Half-way”, centro que
permitiria aos pacientes que acabassem o tratamento primário de continuar a ter
ajuda e trabalhar a sua reinserção, já que muitos pacientes não tinham trabalho
nem casa. De igual forma, criou o “Dia Linn”, um centro para mulheres, em 1956.
Relativamente
ao “Willmar Hospital”, este recebia alcoólicos e doentes mentais e não fazia
diferenciação destes dois tipos, ou seja, fazia desintoxicações e encaminhava
os alcoólicos para junto dos doentes mentais.
Quando
Nelson Bradley, um médico, chegou para responsável do hospital, levou Daniel
Anderson para director Este decidiu alterar e implementar um conjunto de
situações. Passou a separar os alcoólicos dos doentes mentais, introduziu uma
política de porta aberta e introduziu alcoólicos em recuperação como
conselheiros. Com isto, foi criado um novo movimento, em 1954, de
Aconselhamento no Alcoolismo. Assim, membros de AA juntaram-se a psiquiatras,
psicólogos e assistentes sociais no tratamento do alcoolismo e de outras
drogas.
O programa
de Willmar foi o primeiro a desenvolver uma abordagem multidisciplinar, cujo resultado
foi uma combinação de Psicologia Clínica, Medicina e práticas de AA que se começou
a chamar de Modelo Minnesota. Introduziu, também, uma série de novas ideias revolucionárias
para a época: 1) O alcoolismo existe: as pessoas tinham dúvidas sobre a
existência do alcoolismo e não queriam olhar nem acreditar para as suas
consequências e poder. Anderson combateu esta ideia com factos e sinais de que,
de facto, o alcoolismo existia; 2) O
alcoolismo é uma doença: as ideias da época relatavam que com “força de
vontade” se poderia deixar de beber. Anderson introduziu conceitos de que o
alcoólico estava impossibilitado de parar de beber e demonstrava perda de controlo
relativamente à bebida; 3) O alcoólico não tem culpa de ser alcoólico:
anteriormente, havia a ideia da questão da fraqueza moral. Só bebia quem era
“fraco” moralmente; 4) O alcoolismo é uma doença multifacetada: começou-se a
tratar os pacientes de forma holística: física (consequências físicas do abuso
do álcool), emocional (os ressentimentos, os medos e arrependimentos que
levavam ao isolamento e à negação/esconder as consequências) e espiritualmente
(acreditar que sozinhos não conseguem parar de beber); 5) O alcoolismo é
crónico e primário: levou os técnicos a tratar 1º o alcoolismo e não questões
emocionais. Por outro lado, abandonou-se a ideia de curar e iniciou-se um
tratamento com o objectivo de ensinar os pacientes a viverem com a sua doença
de forma totalmente abstinente; 6) A motivação inicial no tratamento não
influência o sucesso do mesmo; 7) A informação sobre o alcoolismo deve começar
na comunidade.
Willmar
foi, de igual modo, o primeiro centro a admitir pessoas com dependências de
outras substâncias e Daniel Anderson introduziu o termo de “dependência
química”. Surgiu, também o termo “adicções cruzadas”, isto é, uma pessoa adicta
a uma substância pode ser vulnerável a desenvolver dependências a outras
substâncias. Neste sentido, os
profissionais concluiram que os alcoólicos e outros adictos podiam ter sucesso
no tratamento se tratados em conjunto. Todos estes conceitos trouxeram a ideia
de tratar em vez de curar. Desenvolveu-se o aparecimento do “Só por Hoje”, de
forma a ajudar os pacientes a lidarem com o facto de viverem a abstinência
dia-a-dia e não para toda a vida.
Com
este conjunto de questões, Anderson e os seus colegas, depararam-se com um
problema: o que fazer com os pacientes durante o dia? A solução passava por
duas dimensões: a primeira, criar um ambiente de tratamento que fosse todo ele
terapêutico, isto é, tudo o que os doentes fizessem deveria permitir alcançar
mudanças na forma de pensar, sentir e agir; os pacientes deveriam ajudarem-se
uns aos outros.
Deste
modo, através de conversas supervisionadas por profissionais, os pacientes
podiam partilhar as suas histórias e o que tinham em comum: a vida destruída
pelas drogas e álcool. Neste sentido, desenvolve-se o conceito de
“identificação”: “eu não estou sozinho”, “o que me aconteceu está a acontecer
com outras pessoas”. Para tornar o ambiente ainda mais poderoso, mais intensivo
e com maior interacção entre os pacientes, Anderson retirou os alcoólicos das
instituições mentais, criando uma área de tratamento diferente.
Foi,
de igual modo, ultrapassada a barreira entre os profissionais e pacientes que
se começaram a tratar por tu, proporcionando mais confiança e auto-revelação;
estes começaram a participar em pequenas sessões de grupo que se focavam em
objectivos específicos de recuperação: lidar com ressentimentos, fazer
reparações de danos causados, por exemplo. Desenvolveu-se a importância das
palestras sobre sinais e sintomas do alcoolismo e a ideia de que ao ajudar os
outros, está-se a ajudar a si próprio. Por outro lado, aparecem as sessões de
terapia individual.
Os
pacientes começam a fazer tarefas diárias, como trabalhos na biblioteca,
lavandaria, cozinha, manutenção da casa. Modificou-se o tempo de tratamento,
que ao invés de ser meses e anos, começou a ser de curta duração, focando-se em
mudanças de comportamento no imediato e não em procurar e curar as causas do
alcoolismo.
Com
todas estas mudanças, que nada tinham de novo (vinham da Medicina, Psicologia e
Psiquiatria, mas foram adaptadas e trabalhadas de forma diferente), o Modelo teve
dois grandes objectivos: ensinar o paciente a desaprender o estilo de vida
auto-destrutivo e promover a abstinência de todas as substâncias. Por outro
lado, apresentou 3 principais perspectivas: tratar os pacientes com DQ (em vez
de os ignorar, julgar ou colocar em hospitais mentais), tratá-los com dignidade
(a mensagem de que era essencial tratá-los com respeito) e tratá-los de forma
holística (físico, mente e espírito).
muito bom material
ResponderEliminar